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MENSAGEM AO EXÉRCITO BRASILEIRO

MENSAGEM AO EXÉRCITO BRASILEIRO
por Sérgio Pinto Monteiro*

Era 15 de fevereiro de 1630 e o nordeste brasileiro começava a viver o pesadelo da invasão dos holandeses da Companhia das Índias Ocidentais. Naquele dia, a cidade de Recife acordou sob o bombardeio da esquadra do Almirante Hendrick Loncq, formada por 50 navios e 7.000 homens. Começava a segunda tentativa dos batavos de se apossar do território brasileiro. Seis anos antes, em 8 de maio de 1624, atacaram e ocuparam Salvador. A reação luso-brasileira, apoiada pela população, não se fez esperar. Militarmente inferiorizadas, nossas forças reagiram com uma intensa guerra de emboscadas. A metrópole portuguesa, com o apoio da Espanha, mandou ao Brasil uma poderosa esquadra de 52 navios e 12.000 homens, entre soldados e marinheiros portugueses e espanhóis, que expulsaram os holandeses da Bahia em 30 de abril de 1625, menos de um ano após o início da ocupação.

Cinco anos decorridos da derrota em solo baiano, a posição estratégica de Recife, a excelência de seu porto natural, a proximidade da Europa e da África e as fracas defesas locais, proporcionaram ao invasor as condições favoráveis a uma nova e vitoriosa campanha, colocando, por 24 anos, parte do nordeste brasileiro sob o domínio holandês.


Os pernambucanos resistiram ao invasor e contra ele lutaram bravamente. Matias de Albuquerque proclamou para toda a Capitania a disposição de lutar até a morte. O inimigo, após conquistar Recife e Olinda, tratou de fortificar suas posições. Como na Bahia, nossa resistência era baseada, principalmente, em emboscadas. Hoje, diríamos que seriam ações de comandos e forças especiais. Construímos, em local estratégico, como baluarte para impedir a penetração do adversário no interior, a fortificação do Arraial do Bom Jesus, que resistiu por cinco anos às investidas dos batavos.

No dia 23 de maio de 1645, dezoito líderes da Insurreição Pernambucana assinaram um Termo Compromisso onde, pela vez primeira em documento, se usava a palavra pátria, no seu sentido atual. Há também, no Compromisso, providências que hoje seriam consideradas como mobilização de Reservas:

“Nós abaixo assinados nos conjuramos e prometemos em serviço da liberdade, não faltar a todo o tempo que for necessário, com toda ajuda de fazendas e de pessoas, contra qualquer inimigo, em restauração da nossa pátria; para o que nos obrigamos a manter todo o segredo que nisto convém…”.

Estava criado, segundo o mestre Capistrano de Abreu, o sentimento da existência nacional brasileira, que iria se fortalecer ao longo dos próximos dois séculos, até a Independência em 1822.

Paralelamente, surgia, consolidado, o Exército de Patriotas, formado pela fusão das três etnias – branca, negra e índia – com suas miscigenações. Nascia o Exército Brasileiro, democracia multirracial, sem discriminações nem preconceitos, sem cotas, numa pluralidade étnica e social unida pela alma de combatente do nosso soldado.

Em 18 de abril de 1648, forças holandesas de 7.400 homens marchou no sentido Barreta-Guararapes, tendo como objetivo final apoderar-se do cabo de Santo Agostinho. O exército patriota, com 2.200 homens, deslocou-se para interceptar o invasor. O sargento-mor Antônio Dias Cardoso, como “soldado mais prático e experiente” sugeriu que o melhor campo de batalha seria o Boqueirão dos Guararapes. Na manhã de 19 de abril, primeiro domingo após a páscoa (pascoela), dia de Nossa Senhora dos Prazeres, Dias Cardoso, no comando de 200 homens, investiu contra a vanguarda inimiga para, em seguida, retrair em direção ao interior do Boqueirão onde o restante do nosso exército estava escondido, pronto para a batalha. Ao comando de “ás de espadas” os patriotas se lançaram sobre o inimigo. O terço (regimento) de Pernambuco, comandado por João Fernandes Vieira, auxiliado por Dias Cardoso, rompeu o inimigo nos alagados; os índios de Felipe Camarão assaltaram a ala direita dos holandeses; o terço dos negros de Henrique Dias atacou a ala esquerda, ficando as tropas de Vidal de Negreiros em reserva. Os batavos contra-atacaram com suas reservas de 1.200 homens, enquadrando o terço de Henrique Dias. Os patriotas, habilmente, lançaram a reserva de Vidal de Negreiros no momento adequado. Foram 4 horas de confronto, entre alagados e morros. Ao final, o exército holandês, derrotado, retirou-se com pesadas perdas – 1.038 combatentes entre mortos e feridos. Já os patriotas, tiveram 84 mortos e 400 feridos. A batalha final que culminou com a derrota e expulsão do invasor holandês ocorreu em 14 de janeiro de 1654, quando o exército patriota atacou o último reduto inimigo em Recife. Após dez dias de combates, a cidade foi reconquistada. No dia 26 de janeiro, na Campina da Taborda, os holandeses assinaram a rendição e retiraram todas as suas forças do Brasil. As vitórias nas Batalhas dos Guararapes uniram, no nascedouro, os conceitos de pátria e exército. E o dia da primeira vitoria – 19 de abril de 1648 – por decreto presidencial de 24 de março de 1994, foi escolhido para Dia do Exército Brasileiro.

No próximo dia 19 de abril, decorridos 373 anos da primeira vitória que culminou com a expulsão do invasor holandês, o Exército Brasileiro – instituição detentora dos maiores índices de confiabilidade do nosso povo – comemora a sua data de origem, num momento em que a nação vivencia uma das maiores crises de sua história. A pandemia, provocada por um vírus de origem ainda não muito esclarecida, enluta inúmeros lares brasileiros, ameaçando destruir a economia do país, com gravíssimas consequências sociais e políticas. São tempos de mudanças, onde o cidadão de bem, estarrecido, constata que o embate político, saudável nas verdadeiras democracias, sofreu uma nefasta radicalização e tem sido desvirtuado por maus brasileiros que, à luz do dia, ludibriam o povo em nome de uma falsa democracia para, na calada da noite, tramarem contra ela, em odiosa, irresponsável e sinistra jornada na busca do poder perdido. O Brasil não é um reduto de traidores, corruptos e sectários. Somos um povo simples, bondoso, às vezes até meio ingênuo, mas profundamente patriota e sempre pronto a defender a grandeza e a soberania da nação. As Forças Armadas, por sua gloriosa história e elevada envergadura moral, são hoje a esperança de milhões de brasileiros que veem nelas o sustentáculo de novos e melhores tempos.

O Dia do Exército será comemorado condignamente pelo governo federal e nas organizações militares. Mas a data, que lembra as vitórias de Guararapes e a epopeia daquele punhado de bravos, será ignorada por expressiva parcela da mídia que, comprometida ideologicamente ou movida por interesses escusos, mantém uma postura hostil com relação às forças armadas brasileiras.

Ao imbatível Exército Brasileiro, defensor intransigente do Povo e da Nação, a cuja Reserva – sempre pronta, atenta e forte – temos a honra e o orgulho de pertencer, reiteramos e renovamos o Compromisso do Aspirantado e reafirmamos nossa fidelidade aos princípios, valores e atributos adquiridos na caserna, bem como lealdade ao Presidente da República, Chefe Supremo das Forças Armadas Brasileiras e a todos os Comandantes e Chefes Militares.

PARABÉNS AO NOSSO INVENCÍVEL EXÉRCITO

*O autor, 81 anos, é professor, historiador e Oficial da Reserva do Exército. É Patrono, fundador e ex-presidente do Conselho Nacional dos Oficiais da Reserva (CNOR). É membro da Academia Brasileira de Defesa, da Academia de História Militar Terrestre do Brasil e do Instituto Histórico de Petrópolis. É presidente do Conselho Deliberativo da ANVFEB. O artigo é pessoal e não representa – necessariamente – o pensamento das entidades mencionadas. Em 31 de março e 1º de abril de 1964, aos 24 anos, integrou, armado, o dispositivo formado por militares e civis voluntários que atuaram na defesa do Palácio Guanabara.

AspMarcelino

Diretor de TI do CNOR